sábado, 31 de março de 2012

Mosca Espanhola (Spanish Fly)

(Lytta Vesicatoria)  - Linnaeus, 1758 (Beetle Blister)


 Este coleóptero, verde metálico dourado, é vulgarmente conhecido no Brasil por besouro venenoso  e na Europa como mosca espanhola, sendo certo que esta última designação não podia ser mais imprópria visto que não se trata de uma espécie que seja endémica de Espanha e tão-pouco é uma mosca. Pode encontrar-se  no centro e sul da Europa e na América do Norte.

Mede de 15 a 22mm de comprimento e 5 a 8mm de largura

As larvas  alimentam-se de pequenas larvas de abelhas e os adultos de folhas e flores de diversas plantas.

O forte cheiro que exala e o veneno que liberta constituem um obstáculo à aproximação dos predadores.

Tal como hoje, já na Grécia e Roma antigas este besouro era conhecido pelas propriedades afrodisíacas devido à cantaridina (C10H12O4), contida nas suas secreções, que, na verdade, é um composto tóxico inibidor das fosfatases de proteínas 1 (PP1) e 2A (PP2A), que pode provocar grave inflamação na pele e é muito tóxica quando ingerida, podendo ocasionar danos nos rins, no trato gastrointestinal e irritação no aparelho urinário, de que pode resultar a erecção, razão pela qual se pensava, erradamente, que se tratava de um afrodisíaco. No passado foi esta substância usada não só como afrodisíaco mas também como abortivo. Diz-se que a Aqua Toffana ou Aquetta de Nápoles, que se pensa ter sido utilizada pelos Médicis, é uma mistura de arsénico e cantáridas. Quatro a seis gotas deste veneno adicionadas à água ou ao vinho são suficientes para provocar a morte.

 A saúde de animais é também posta em perigo pela ingestão, juntamente com o feno, de grandes quantidades deste insecto.

Reino:         Animalia
Filo:            Arthropoda
Subfilo:       Hexapoda
Classe:       Insecta
Ordem:       Coleoptera
Família:      Meloidae
Subfamília: Meloinae
Tribo:         Lyttini
Género:      Lytta
Espécie:     Vesicatoria L.


                                                Imagens captadas em Paço de Arcos












sábado, 10 de março de 2012

Devoção a Santa Marta

Lá no alto da Serra de Santa Marta foi em tempos, que se perderam na memória dos nossos avós, erigida uma minúscula  capelinha que abrigava uma também muito pequena imagem de Santa Marta. Às vezes dou comigo a pensar se a Serra tem aquele nome devido à Santa ou se a Santa se chama assim por ter aparecido naquela Serra.  Bem, vou deixar esta questão para os estudiosos destas  matérias, aqueles  que passam a vida toda a studar, rodeados de livros. 

Na Benquerença, em cujos limites se situa a ermida, sempre  houve devoção a Santa Marta, mas como é grande a distância que a separa do Povo, Deus  nos perdoe (e a Santa tamem), era votada  a um certo abandono. Os seres que mais companhia lhe faziam acabavam por ser os lobos, que naquele tempo havia por ali em grande abundância. Com isto não se vá pensar que eles poderiam por em perigo a integridade da imagem, nada disto, pelo contrário, não se sabe bem porquê, ou melhor eu cá no sei,  mas as feras, talvez por instinto ou lá o que seja, são muito sensíveis ao Sagrado e constituem-se como guardiões de todas as Santas e Santos que se encontram  em locais isolados. Aqui está mais uma matéria que acho que deveria ser motivo de estudo. Penso que poderia até ser um trabalho a integrar numa qualquer tese de mestrado ou doutoramento em Teologia. Aqui fica o apelo.

A fé manifestava-se mais pelo pensamento e só muito raramente em acções concretas. O caminho mal andamoso, para lá chegar, também não ajudava nada. Os que se aventuravam a ir até lá eram motivados pelo cumprimento de promessas feitas. Em situações mais aflitivas pediam à Santa que os ajudasse a ultrapassar graves problemas, quase sempre, mas não apenas, relacionados com saúde.  

 De todos  os devotos havia um que, pelo seu fervor, se destacava dos outros : era o Ti Luís Carmona, um homem alto e seco, que  morava, ao pé do lagar do Senhor Esteves, próximo da fonte de baixo, os mais novatos já no s'alembram dele, já há muito que se finou, tenho a certeza que só pode estar sob a protecção da Santa, que tanto adorava. A rapaziada do meu tempo conhecia-o bem...

 A fé pela Santa aumentava de intensidade em alturas de maiores apertos. Isto parece acontecer um pouco com outras Santas, repare-se no que sucede com a Santa Bárbola, a das trovoadas, a malta só pensa nela quando stá  à rasca, com o medo que lhe caia algum raio em cima. Em anos de grande seca lá ia o Ti Carmona até ao alto da Serra com o propósito de trazer a Santinha para o Povo, penso que por iniciativa própria, mas também incentivado por outros que viam o gado definhar, sem terem nada para lhe dar, temendo também pela dificuldade em obter o seu próprio alimento.

De mods que, como stava a contar, o nosso homem metia-se ó caminho e, de volta, trazia a Santa até ao povoado. Iniciava depois uma digressão/procissão pelas ruas da Benquerença, coadjuvado por alguns acólitos, que tinha por fim dar aos habitantes a possibilidade de poderem pedir, de viva voz e presencialmente, à milagrosa Santa que intercedesse lá nas Alturas para que Deus lhes mandasse a chuva, daquela bem caída. Nada de trovoadas que acabam por trazer mais estragos do que benesses e obriga os lesados a, neste caso, pedir a ajuda à já citada Santa Bárbola, que não tem ermida por estas bandas. Era assim como que, salvo seja, uma procissão religioso-pagã em que se dispensava a presença eclesiástica.

À passagem da imagem todos simulavam ajoelhar-se, benziam-se respeitosamente e rezavam um Padrenosso e ma Ademaria. Toda a gente contribuía com o que podia, dinheiro ou mesmo bens alimentares como forma de agradecimento à Santa Martinha (modo como alguns carinhosamente a tratavam) que, estavam certos, não deixaria de ouvir as suas preces. O Ti Luís Carmona e acompanhantes não negavam também aceitar, aqui e ali, um copito de vinho e uma bucha, de acordo com os hábitos da terra. Até porque não se deve ignorar que esta era uma tarefa árdua e penosa, que ocasionava desgaste físico, com a consequente perda de energia, que deveria, portanto, ser regenerada a cada momento. Digamos que essa regeneração chegava, por vezes, a ultrapassar os limites do necessário. Isto devia-se à obrigação que todos sentiam de contribuir, fosse lá como fosse!

Quase sempre o milagre acontecia, ainda não se tinha dada volta a metade do Povo e já o Céu se notava carregado de grandes e escuras nuvens indiciando a proximidade da queda da tão desejada chuva! Haja de Deus clamavam uns, milagre diziam outros! Passado pouco mais de um quarto de hora e já ela jorrava, assim mesmo como era desejada, muito certinha,  dos celestiais chuveiros, para grande satisfação de todos os benqueridos!

Para protecção da Santa alguém se apressava a emprestar um guarda-chuva. O Ti Carmona, os que o acompanhavam, e, em geral, todo o povo, não se incomodavam nada com a grande molha com que estavam a levar. Apenas um ou outro menos crente é que se abrigava. Era daquelas chuvadas c'até dava gosto sentir bem entranhada nos ossos.

Só por força da grande fé era possível que a  Santa Marta desse a volta a todas as ruas da aldeia, tal era o estado lamacento em que já se encontravam. Uma vez o Ti Luís escorregou e só por milagre não deixou cair a Santa. Nesse tempo só muito poucas eram calcetadas, não há comparação possível com o estado em que hoje se encontram.

A imagem era depois conduzida à Igreja Matriz onde passava a residir por uns tempos, ficando acompanhada de outras Santas e Santos, como Nossa Senhora das Neves (padroeira da aldeia), da Santa Flomena, do Santo Antonho, do Martlo S. Sabastião, entre outros.

Uma dúvida, que na altura não me ocorria, paira hoje no meu espírito: não sei qual era o destino dado às ofertas feitas à Santa. Um dia vou tentar saber. É bem possível que fossem arrecadadas pela Fábrica da Igreja a fim de serem utilizadas em obras de beneficiação. Na capelinha lá no alto da Serra não me consta que alguma vez as tenha havido. Foi um pensamento, menos católico, que me ocorreu de momento, a verdade é que o importante mesmo era a vinda da solicitada chuva, tudo o resto era secundário.

Durante mais de um mês, abençoada, caiu quase sem interrupção c'até dava gosto vê-la! As searas de trigo viam-se de dia para dia a crescer impulsionadas por um novo vigor. Quando já se receava o pior, um novo alento nasceu na nossa gente, se Deus quiser podemos ainda vir a ter um bom ano de trigo!

Segundo me constou a Santa Marta mora agora na capela de Nossa Senhora da Quebrada, que também era, por vezes invocada para a vinda de chuva. Parece-me bem, a solidão nunca foi boa conselheira para ninguém, é minha convicção que nem as Santas a desejam. Quando voltar à Senhora da Quebrada vou dar uma espreitadela pela janela e olhar bem para ver se vislumbro a Santa Marta, a quem, com humildade, vou implorar a sua protecção para o nosso povo, que bem precisado anda de ajuda. Quem sabe se ela não pode interceder por nós  ajudando-nos a exorcizar os males que mais parecem ser fruto da gestação dos ovos que a serpente infernal parece ter, ultimamente, deixado nas Lusas Terras!

Assim seja.

Jogilbo


Nota: Não foram considerados acordos que impeçam o povo de se expressar livremente.